segunda-feira, 26 de outubro de 2020

5 capas e contracapas, uma análise

Para o exercício proposto em aula, decidi partilhar um primeiro conjunto de obras publicadas pela editora Orfeu Negro. Este conjunto de livros faz parte de um catálogo (ainda em construção) marcado por questões ligadas à identidade, género, raça e sexualidade, numa perspetiva interseccional. Isto, a meu ver, acarreta uma intenção política por parte da editora. Ao decidir disponibilizar na língua portuguesa, uma série de textos fundamentais nos campos da teoria feminista e queer, a editora mostra e comprova a importância da edição e da tradução na disseminação de textos clássicos, anteriormente não disponíveis para uma comunidade falante onde tais palavras não existiam.

Do ponto de vista editorial, considero que as edições aqui apresentadas, não só são incrivelmente belas, como também convidam leitores não familiarizados a quererem aproximar-se destas, sem nunca se terem cruzado previamente com tais autor/as. Os livros em causa foram editados a pensar numa panóplia de leitores (des)comprometidos. No que diz respeito à conceção gráfica, os livros apresentam um compromisso entre o texto e o livro-objeto, criando uma ponte onde o diálogo é em simultâneo verbal e visual. Ou seja, cada livro apresenta uma proposta do seu conteúdo com recurso a pequenas ilustrações ou cores.


Numa breve apresentação visual dos livros, vemos em Não serei eu mulher?

As mulheres negras e o feminismo um curioso desenho que lembra um grupo de mulheres com cabelos crespos movimentando-se, em traços negros. Em Memórias da Plantação

Episódios de Racismo Quotidiano, há um brilhante jogo com a escolha do papel prateado. O livro remete-nos para a Memória e para a Psicanálise, refletindo a nossa própria imagem, confrontando-nos com o eu/outro. No Problemas de Género, escolheu-se o laranja para ligar ideias um tanto controversas, porém decisivas no campo da identidade e do género na contemporaneidade. Optou-se uma vez mais por um traçado em preto, formando uma espécie de letra b, inicial do apelido da autora, marcando o seu peso nos estudos de género e teoria queer. Por fim, no Manifesto Contra-Sexual, obra deliciosa que propõe uma reflexão sobre o corpo, o desejo, o prazer e a tecnologia, onde as fronteiras e os territórios identitários/sexuais questionam a heteronormatividade enquanto regime político. Aqui escolheu-se a figura de um dildo pela sua carga simbólica, que retira o homem do centro, permitindo novas práticas e regimes de desejo.


As capas e as suas contracapas não parecem obedecer aos cinco elementos discutidos em aula. Nestes quatro livros, optou-se antes por uma linha minimalista, que se pode justificar pela agenda editorial da marca, visto que a mesma edita obras no âmbito das artes contemporâneas. Como podem observar nas imagens, as contracapas, ou ostentam um excerto escolhido à medida, ou uma ilustração que concorda com a capa. A biografia e a sinopse encontram-se escondidas na capa e na contracapa de cada livro.


Por último, a quinta escolha que quero partilhar convosco, trata-se de uma edição publicada em 2018, que comemora o bicentenário da obra de Mary Shelley, Frankenstein; or, The Modern Prometheus. A editora Penguin Books dispõe de um catálogo (Penguin Classics) onde obras canónicas são reeditadas. Cada obra apresenta a conhecida espinha ou lombada preta, assim como uma ilustração para a capa, sugerindo uma imagem comprometida com o enredo. Creio que esta decisão por parte da editora prende-se com a possibilidade de unir a/o leitor(a) ao texto. Ao oferecer uma espécie de acepipe, a editora abre o apetite à/ao leitor(a), convidando-a/o a querer mais. O livro em questão apresenta o título da autora, porém os restantes quatro elementos parecem estar em falta. Esta opção deve-se ao formato destas publicações, assumindo que tais nomes dispensam apresentações.


Numa nota pessoal, escolhi este exemplar pelo casamento entre a ilustração e o texto. A imagem representa fielmente a trágica condição da monstruosa criatura que é abandonada e rejeitada por todos. Esta encontra-se a olhar para o seu reflexo num pequeno lago, o que me remete de imediato para a autoperceção e construção da identidade e do eu.


Miguel A. Baptista








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