segunda-feira, 31 de maio de 2021

Trabalho entrega

 Meus caros, conforme disse, os prazos só devem ser esticados quando quem tem de os cumprir esgotou mesmo o tempo. Têm (quem não conseguir antes) até dia 5. 

Qualquer dúvida, esclarecimento etc. falem comigo. 

sábado, 29 de maio de 2021

O Surfista ---> Os Surfistas

 Ontem falei disto. Acho que pode ter algum interesse para vocês. 







Espiritualidade quântica

 Pessoalmente, não aprecio este tipo de livros. Mas são produtos ágeis e fazem uma coisa importante para os livros: vendem. 

Na Bertrand Saldanha, os livros da autora estão em destaque. Levei cinco minutos a encontrar o mais recente livro de Eduardo Pitta, e outros tantos (esforcei-me por não pedir ajuda) a encontrar o novo romance de Patrícia Portela – Hífen – que foi capa no JL. Mas os de Inês Gaya estavam em destaque à entrada. 





segunda-feira, 24 de maio de 2021

Última aula: quarta 26

 Será a última aula oficial, embora eu esteja disponível para aulas extra e conversas por zoom. 

Se alguém quer apresentar oralmente um trabalho diga. 

Balanço: o que aprendemos/o que ficou por aprender? 

O vosso percurso: o que fazer com o mestrado? Como usar o que aprendemos? Que instrumentos adquirimos para lidar com o que não aprendemos? Como aprender a ser díctil, flexível, ágil e potenciar as eficiências ao mesmo tempo que reduzimos as ineficiências a um Rt aceitável?  

Em baixo, um artigo agridoce sobre os jornais: 


Primeiro muito devagar, e depois subitamente

Rogério Casanova

DN, 23 Maio 2021 — 00:23

No segundo episódio da segunda temporada de Succession, dois herdeiros da família Roy, Roman e Kendall, percorrem a redacção do Vaulter, um jornal digital recém-adquirido pelo seu império de comunicação. Um dos irmãos olha à sua volta - observando dezenas de corpos debruçados sobre secretárias, inclinados perante monitores - e comenta em surdina com o outro: "tantos falsos jornalistas, todos a fingir que trabalham". O objectivo da visita é avaliar números - tráfego, visitas, cliques diários - e decidir a viabilidade do site. Mas na verdade a decisão já estava tomada, e o episódio emoldura-a entre dois discursos. No primeiro, Kendall oferece à redacção um ramalhete de banalidades motivacionais: garantias de que são todos "uma família" e de que o Vaulter é o "futuro do grupo", promessas de aumentos salariais e receptividade a "novas ideias", etc. O propósito é ganhar tempo, retardando um processo sindical em curso, e permitindo que uma equipa a trabalhar em segredo nos bastidores consiga assumir controlo dos arquivos do site. O segundo discurso, mais breve, limita-se a informar centenas de pessoas que acabaram de perder o emprego, e que têm 15 minutos para recolher os seus pertences e sair do escritório. O site continuará a existir com o mesmo nome num estado vegetativo, com apenas cinco estagiários sob a supervisão de um único editor - e a espremer valor residual dos arquivos e da marca enquanto for possível.

Através de manchetes fugidias vistas em ecrãs (Is Every Taylor Swift Lyric Secretly Marxist?) a série estabelece o Vaulter como um arquétipo familiar na paisagem online: a fábrica de conteúdos digitais (concebidos menos para serem lidos do que para gerarem partilhas) que vai conseguindo flutuar acima da linha de água à custa de um generoso investimento inicial, de manipulações algorítmicas, e de muitos dados massajados. Ao condensar este ciclo de vida num episódio de uma hora, a série relega o estado semi-comatoso para fora do ecrã, e inverte o modo mais comum como um "jornal", no sentido mais abrangente do termo, costuma morrer, que é mais o menos o modo como Hemingway descreveu a falência. No romance O Sol Nasce Sempre, alguém pergunta a um temperamental veterano de guerra escocês chamado Mike Cambpell como perdeu todo o seu dinheiro. "De duas maneiras", responde. "Primeiro muito devagar, e depois subitamente".

Os primeiros sintomas costumam afligir a indústria inteira, o que cria a falsa segurança de um inexorável (e colectivo) "processo" de transformação. A primeira coisa que desaparece é aquilo que custa mais (em tempo ou em dinheiro): investigações longas, reportagens no estrangeiro, despesas de viagem, etc. Depois, todos os atalhos se vão tornando mais curtos. Copy desks desaparecem. As redacções começam a encolher por ordem cronológica: veteranos aceitam rescisões amigáveis e as suas funções são redistribuídas pelas várias castas temporárias - estagiários, colaboradores, freelancers. Reuniões estratégicas começam a ser mais frequentes. A ordem das secções é reconfigurada como um baralho de cartas. Reinvenções são anunciadas. Suplementos são rebaptizados. Mudanças de tom são sugeridas: o jornal deve tornar-se mais ligeiro, mais profundo, mais especializado, mais generalista, mais local, mais global. Como um paciente terminal, o jornal começa a ser mais vulnerável a charlatães e curas milagrosas. Várias estratégias são adoptadas, na esperança de que alguma pegue (paywalls, doações voluntárias, fundações, parcerias) Quando a calamidade seguinte acontece (uma crise financeira, uma pandemia) um ou outro lay-off costuma preceder o inevitável despedimento colectivo, noticiado provavelmente não em números mas em fracções ("um quarto dos funcionários", "um terço da redacção"). Não é suficiente. As "dificuldades de tesouraria" tornam-se crónicas. As pressões produtivas aumentam em proporção inversa à disponibilidade de recursos: perto do fim, é esperado que uma dúzia de pessoas consigam fazer melhor um trabalho que antes era feito por meia centena. São precisos mais cortes. E aquilo que acontece muito devagar pode continuar a acontecer muito devagar durante muito, muito tempo.

O modelo de produção de notícias extremamente lucrativo que durou até aos anos 80 pode ser hoje identificado como uma anomalia, resultado de um conjunto intrincado de incentivos historicamente contingentes. Os jornais prosperaram enquanto puderam ser essencialmente financiados por publicidade - enquanto foram o mais eficaz elo de ligação entre anunciantes e consumidores. A internet dinamitou este monopólio informal. Muitos anunciantes migraram para motores de busca ou plataformas de agregação. Relógios de luxo e suplementos de dieta perceberam que é mais eficiente esbanjar orçamentos de marketing no Facebook ou no Instagram do que sepultá-los entre reportagens parlamentares.

Mas o modelo específico do jornal "generalista" também permitia o subsídio invisível do consumo em massa, pois fornecia algo para todos. Um leitor podia ignorar todas as notícias nacionais e internacionais, e comprar o jornal apenas para saber os resultados desportivos, ou consultar a programação de TV, ou espreitar os anúncios de emprego, ou resolver os problemas de xadrez, ou ler a banda desenhada. Os leitores que compravam o jornal por estarem interessados em x financiavam indirectamente os leitores que compravam o jornal por estarem interessados em y, e vice-versa. Aquilo que custava mais dinheiro (correspondentes estrangeiros, jornalismo de investigação) podia ser financiado por quem não lia. Colunas de opinião podiam ser financiadas por pessoas que detestavam o que o colunista dizia. A internet não se limitou a criar a ilusão de que tudo isto era, ou podia ser, gratuito: também fragmentou o conteúdo em tantos nichos que nenhum consumidor precisa de financiar outros interesses que não os seus.

A paisagem mediática de hoje parece-se muito mais com a do séc. XIX do que com o período de prosperidade pós-guerra em que se consolidaram não só a maioria das normas como até o entendimento que ainda hoje temos do jornalismo. Um desses recidivismos é a figura do magnata da imprensa, o mecenas cujo estatuto vem de estar disposto a gastar dinheiro que mais ninguém tem para fazer algo que talvez já não seja possível fazer: "salvar" o jornalismo, não apenas como prática, mas como prática comercialmente lucrativa. Um por um, mais tarde ou mais cedo, todos acabam por perceber que mesmo que um conjunto de golpes de sorte e práticas brilhantes os tenham tornado ricos, esses golpes e práticas não são transferíveis para todas as áreas, nem capazes de erradicar décadas de hábitos complacentes, nem de alcançar o milagre alquímico de fazer com pouco dinheiro um produto que custa muito dinheiro a fazer. Excepto aqueles que decidiram financiar jornais por outro propósito que não o lucro (influência política, vaidade pessoal, etc), todos vão perder o interesse, como perderam o interesse noutras indústrias em declínio. A diferença de base é pouco mais que retórica: os clubes de vídeo e os amoladores de facas nunca conseguiram convencer-se a si próprios de que eram baluartes indispensáveis da democracia.

Primeiro muito devagar, e depois subitamente. Tal como tudo o resto, também as eutanásias dos jornais serão mediadas pelos filtros existentes - e serenamente inseridas nas várias escaramuças culturais em curso. Alguns óbitos serão aplaudidos outros lamentados (em função de serem "de esquerda" ou "de direita", do Benfica ou do Sporting, etc), mas a maioria será ignorada. Alguns chegarão ao fim como o Vaulter: com uma mão cheia de estagiários e um último editor, que vai aproveitar o seu derradeiro espaço de opinião para explicar solenemente que o "tribalismo" das "redes sociais" e a "sanha persecutória" da "inquisição digital" representam um problema gravíssimo, uma ameaça existencial à liberdade de expressão. A coluna será publicada assim, não ironicamente, mas com total seriedade, antes de alguém apagar a luz.

 




domingo, 23 de maio de 2021

 Título : Festejos Covid por piedade para com os festejadores

 https://ionline.sapo.pt/artigo/735425/e-plausivel-que-haja-uma-associacao-entre-aumento-de-casos-em-lisboa-e-os-festejos-do-sporting?seccao=Portugal_i

Saiu esta no notícia no jornal I hoje. É uma situação engraçada que uma equipa de futebol (o nosso tão amado futebol) tenha provocado festejos em massa que puseram em risco a saúde pública. Ninguém a trabalhar no Estado se lembrou dos habituais festejos? Quer dizer, uma coisa é ter dó de quem não festeja o nascimento de uma andorinha já mais de vinte anos, outra é ignorar que os festejos iam obviamente acontecer.


DestaqueÉ preocupante o aumento de casos em Lisboa?

Acima de tudo é um sinal de aviso que não deve ser ignorado. Lisboa é o maior concelho do país com mais de meio milhão de habitantes, havendo várias ligações pendulares com outros locais, pelo que este aumento pode ter um impacto regional e nacional.

Ponto equidistante



Nelson Silva


segunda-feira, 17 de maio de 2021

sexta-feira, 14 de maio de 2021

OCR - digitalizando textos antigos e não só

 O OCR (Optical Character Recognition) é uma forma de digitalizar um texto. Geralmente faz-se com textos antigos ou que, tendo sido publicados antes do computador, queremos guardar. O OCR também é usado para reedições, quando o original foi publicado noutra editora. 

Um dos problemas é que o sistema tende a confundir algumas letras: o l e o 1, o r e o v, o m e o n...

Uma leitura humana é sempre recomendável, tal como com as traduções google. 


Exercício 30 - ajude um texto a comunicar melhor

Na verdade é o 31, porque nós fizemos também uma prova cega (lembram-se?) com trechos de Saramarog e Lobo Antunes. 

Este artigo de opinião saiu hoje, 14  de maio, no jornal i

1. Ajude-o a ficar melhor, aplicando a técnica do esforço mínimo. 

2. Arranje um título (ou, se for espreitar - preferia que não - comente se acha o do autor adequado). 

3. Faça um destaque (80-120 c.)

Nota: você não tem de concordar ou não. É um trabalho. Quem for bom a fazê-lo terá aqui uma oportunidade de negócio, porque o que não faltam são clientes com pódio mas carecendo de ajuda.  


TÍTULO: ........................

Que o jornalismo é uma actividade fundamental em qualquer democracia e Estado de Direito que se preze, ninguém tem dúvidas. Que os jornalistas enquanto motor da actividade em questão são peça fundamental do escrutínio público que a sustenta, sobretudo no que à política e seus agentes diz respeito, muito menos. Digo-o honestamente, sem qualquer falsidade pessoal.

Contudo, é igualmente inequívoco, sobretudo pela sua repetição ao longo dos tempos, que há alguns jornalistas que não primam propriamente por estes princípios, circunstância que não colocando em causa a idoneidade de todo o sector em questão, merece ainda assim a devida reprovação.

Fernanda Câncio é, em minha opinião, um exemplo claro do que acabo de considerar. Sobretudo porque é estranhíssimo que alguém que tenha tido uma relação tão próxima com José Sócrates e aparentemente nunca tenha estranhado nada nos seus comportamentos e estilo de vida, insista reiteradamente em censurar todos aqueles com os quais discorde.

Esta semana, após a ida de André Ventura a tribunal pela utilização de uma imagem afecta a moradores do Bairro da Jamaica durante o seu debate presidencial contra Marcelo Rebelo de Sousa (circunstância por si só, ridícula), escreveu um artigo em que não se coibiu de colocar em causa o que no tribunal havia sido dito pelo próprio ou por outros representantes do CHEGA.

Como digo é tudo muito estranho. Sobretudo quando da escrita que assinou me deu a sensação que colocou em causa algumas declarações que teriam que ver com a origem de algumas contas de redes sociais ligadas ao partido.

Estaria Câncio a dormir, ao ponto de nunca ter questionado a origem das contas bancárias do seu ex-namorado bem como o dinheiro que a seu lado gastava e do qual, mesmo que indirectamente, também nessa época, usufruía?

Não estou com isto a dizer que a origem dessas contas e do seu recheio seria ilícita ou não, que José Sócrates é culpado de alguma coisa ou que Câncio fosse disso conhecedora e ao sê-lo o devesse ter denunciado. Tenho a minha opinião, mas disso ter-se-ão de se encarregar os tribunais.

Aquilo que sinto poder dizer, porque é a minha opinião e dela ninguém me pode privar, é que Fernanda Câncio não passa de uma hipócrita que não reunindo os níveis mínimos de idoneidade pessoal, intelectual e profissional, não respeita também o significado da palavra coerência.

Disso deve Fernanda Câncio envergonhar-se. Envergonhar-se porque em vez de se preocupar em perseguir André Ventura e o Chega se deveria preocupar antes em criticar e questionar quem enquanto primeiro-ministro conduziu o país onde ele se encontra.

Para finalizar, porque pese embora confesse tenha achado estranho, devo dizer que ao mesmo tempo também isso me divertiu, eu que acompanhando André Ventura a esta audiência, ao olhar para o meu lado direito dei com Fernanda Câncio sentada praticamente a meu lado para assistir ao julgamento em causa, gostaria que a mesma me explicasse porque não compareceu ao julgamento de José Sócrates para poder fazer o relato que fez sobre a audiência de André Ventura com a mesma ferocidade.

 - Será porque Fernanda Câncio, também ela, consta dos autos do Processo Marquês?

 - Será porque Fernanda Câncio foi também ela escutada em conversas telefónicas meio codificadas e por isso, estranhas?

 - Será porque a sua suposta valentia só serve para criticar aqueles de que não gosta e desaparece perante aqueles sobre quem alegadamente impendem as mais sérias dúvidas?

São questões que deixo e se para elas não tenho resposta, há uma coisa que sei. Não há uma só palavra que dita ou escrita por Fernanda Câncio possa ser levada a sério.

Rodrigo Alves Taxa

quinta-feira, 13 de maio de 2021

Análise SWOT - Pessoas Normais de Sally Rooney

 Filipe Heath 



Strengths - Pessoas Normais segue duas pessoas comuns, com defeitos, qualidades, valores e vontades. As personagens desenvolvem-se ao longo do livro e as suas escolhas têm sempre influência no seu dia-a-dia. No final do livro, os personagens conhecem-se bem a si próprios e o que querem para o seu futuro. 

Weaknesses - A autora introduz vários temas neste livro tal como: ansiedade, depressão e relacionamentos abusivos visando criar uma discussão importante. Acaba por ser superficial, foca-se demasiado no romance e faz uma fraca exploração dos problemas por não os aprofundar. Acredito que esse não seja o objetivo da autora.

Opportunities - Pessoas Normais lembra-nos que há por vezes pessoas que nos fazem tão bem e tão mal ao mesmo tempo mas a vida continua, independentemente dos desafios que ela nos colocar. Temos a oportunidade de refletir na forma como nos relacionamos com as pessoas.

Threats - Discussão política insensível e romantização das dificuldades dos protagonistas. 

O que são grandes títulos?

 Filipe Heath

Como já conseguiram perceber eu falo várias vezes, diretamente ou indiretamente, da importância da diversidade na literatura. Façam um exercício de reflexão e observem atentamente as vossas estantes, quantos autores brancos estão presentes comparativamente a autores negros e/ou asiáticos? E dentro dos autores brancos, quantos deles são cis-gênero e heterossexuais? A primeira reação ao ler isto é logo: para mim a cor da pele ou identidade de gênero/orientação sexual não importa, eu leio o que eu quero. Mas já pensaram que autores de comunidades marginalizadas têm muito menos oportunidade de serem publicados simplesmente por serem quem são? O leitor tem um papel grande a combater este facto.

Este mês estou a fazer um esforço para ler apenas autoras asiáticas portanto partilho com vocês cinco livros de autoras asiáticas que tenho lido ao longo deste ano e que recomendo vivamente, seja pela escrita, construção de personagens, plot ou discussões pertinentes. 











Masterclass II: com João Morales

 João Morales foi diretor da revista mensal Meus Livros, jornalista, editor, e trabalha há muitos anos na área do fomento cultural. É o criador do Festival Livros a Oeste, na Lourinhã, a decorrer esta semana . 

Aqui, uma das sessões do festival com o próprio Morales como entrevistador. 

A sessão será presencial. Tragam perguntas. O João é umas pessoas mais activas nos últimos vinte anos no mundo editorial e, se não souber, diz que não sabe. Mas provavelmente sabe. 


quarta-feira, 12 de maio de 2021

Aula de hoje (12/5) e masterclass na próxima, talvez

 Hoje a aula será breve, mas suculenta, espero. 

Serão emprestados livros - algo de que temos sentido falta. 

Em princípio, na próxima aula teremos novo convidado: João Morales, o mentor do festival Livros a Oeste, a decorrer esta semana na Lourinhã e Online. 

Adenda: muito engraçada, esta edição do The Guardian a celebrar os seus 200 anos e a apontar os piores erros cometidos. 




«Cuidado com os revizores», por Luis Fernando Verissimo

Todo escritor convive com um terror permanente: o do erro de revisão. O revisor é a pessoa mais importante na vida de quem escreve. Ele tem o poder de vida ou de morte profissional sobre o autor. A inclusão ou omissão de uma letra ou vírgula no que sai impresso pode decidir se o autor vai ser entendido ou não, admirado ou ridicularizado, consagrado ou processado. Todo texto tem, na verdade, dois autores: quem o escreveu e quem o revisou. Toda vez que manda um texto para ser publicado, o autor se coloca nas mãos do revisor, esperando que seu parceiro não falhe. Não há escritor que não empregue palavras como, por exemplo: "ônus" ou "carvalho" e depois fique metaforicamente de malas feitas, pronto para fugir do país se as palavras não saírem impressas como no original, por um lapso do revisor. Ou por sabotagem.

Sim, porque a paranoia autoral não tem limites. Muitos autores acreditam firmemente que existe uma conspiração de revisores contra eles. Quando os revisores não deixam passar erros de composição (hoje em dia, de digitação), fazem pior: não corrigem os erros ortográficos e gramaticais do próprio autor, deixando-o entregue às consequências dos seus próprios pecados de concordância, das suas crases indevidas e pronomes fora do lugar. O que é uma ignomínia. Ou será ignomia? Enfim, não se faz.

Pode-se imaginar o que uma conspiração organizada, internacional, de revisores significaria para a nossa civilização. Os revisores só não dominam o mundo porque ainda não se deram conta do poder que têm. Eles desestabilizariam qualquer regime com acentos indevidos e pontuações maliciosas, além de decretos oficiais ininteligíveis. Grandes jornais seriam levados à falência por difamações involuntárias, exércitos inteiros seriam imobilizados por manuais de instrução militar sutilmente alterados, gerações de estudantes seriam desencaminhadas por cartilhas ambíguas e fórmulas de química incompletas. E os efeitos de uma revisão subversiva na instrução médica são terríveis demais para contemplar.

Existe um exemplo histórico do que a revisão desatenta - ou mal-intencionada - pode fazer. Uma das edições da Versão Autorizada da Bíblia publicada na Inglaterra por iniciativa do rei James I, no século XVII, ficou conhecida como a "Bíblia Má", porque a injunção "Não cometerás adultério" saiu, por um erro de impressão, sem o "não". Ninguém sabe se o volume de adultérios entre os cristãos de fala inglesa aumentou em decorrência dessa inesperada sanção bíblica até descobrirem o erro, ou se o impressor e o revisor foram atirados numa fogueira juntos, mas o fato prova que nem a palavra de Deus está livre do poder dos revisores.

A mesma bíblia do rei James serve como um alerta (ou como o incentivo, dependendo de como se entender a história) para a possibilidade que o revisor tem de interferir no texto. O objetivo de James I era fazer uma versão definitiva da Bíblia em inglês, com aprovação real, para substituir todas as outras traduções da época, principalmente as que mostravam uma certa simpatia republicana nas entrelinhas (como a Bíblia de Genebra, feita por calvinistas e adotada pelos puritanos ingleses, e que é a única Bíblia da História em que Adão e Eva vestem calções. Para isso, James reuniu um time dividido entre os que cuidariam do Velho e do Novo Testamento, das partes proféticas e das partes poéticas, etc.. Especula-se que as traduções dos trechos poéticos teriam sido distribuídas entre os poetas praticantes da época, para revisarem e, se fosse o caso, melhorarem, desde que não traíssem o original. Entre os poetas em atividade na Inglaterra de James I estava William Shakespeare. O que explicaria o fato de o nome de Shakespeare aparecer no Salmo 46 - "shake" é a 46ª palavra do salmo a contar do começo, "speare" a 46ª a contar do fim. Na tarefa de revisor, e incerto sobre a sua permanência na História como sonetista ou dramaturgo, Shakespeare teria inserido seu nome clandestina e disfarçadamente numa obra que sem dúvida sobreviveria aos séculos. (Infelizmente, diz Anthony Burgess, em cujo livro A mouthful of air a encontrei, há pouca probabilidade de esta história ser verdadeira. De qualquer maneira, vale para ilustrar a tentação que todo revisor deve sentir de deixar sua marca, como grafite, na criação alheia.)

Não posso me queixar dos revisores. Fora a vontade de reuni-los em algum lugar, fechar a porta e dizer "Vamos resolver de uma vez por todas a questão da colocação das vírgulas, mesmo que haja mortos", acho que me têm tratado bem. Até me protegem. Costumo atirar os pronomes numa frase e deixá-los ficar onde caíram, certo de que o revisor os colocará no lugar adequado. Sempre deixo a crase ao arbítrio deles, que a usem se acharem que devem. E jamais uso a palavra "medra", para livrá-los da tentação.

domingo, 9 de maio de 2021

De portas abertas

Joana Camões Pereira


Há duas sessões, o editor João Concha deu-nos a conhecer o seu método de trabalho e expôs alguns do problemas e entraves que encontrou ao longo do seu percurso com a não (edições).

Hoje, deixou-vos a ligação para o podcast da Cultura Editora, «É Outra História», que, por outra via, nos dá a conhecer um pouco da realidade desta editora. O programa já conta com três episódios, todos eles apresentados pelo coordenador editorial, e em cada um deles aborda-se uma das fases de produção, contando com convidados — o editor, autores da casa, uma paginadora, uma revisora e uma capista do grupo Leya.

Tanto quanto sei, é a única editora que partilha este tipo de material, que nos permite bisbilhotar um pouco o que se passa dentro das paredes de uma casa editorial. O que se pode tirar daqui não é uma fórmula mágica, são apenas experiências e perspectivas pessoais, mas que nos podem ajudar a evitar erros, a despertar sensibilidades e a perceber que cada casa tem um tapete diferente.

sábado, 8 de maio de 2021

Sumário da última aula (em construção)

5

 O booktrailer da Ana Filipa está perto do perfeito. Só sugiro umas déciams de segundo mais de música introdutória. Mas terei razão? Não sei. Não estou seguro. Uma vez sugeri a um poeta que tirasse os pontos finais, «para dar mais espaço aos versos, menos determinismo» e, meses mais tarde, esquecido, após ele sugerir as minhas dicas, disse-lhe o contrário: «Ó pá, devias pôr uns pontos finais, para tornar os versos mais afirmativos, determinados». Quem/quando tinha razão? Por vezes é óbvio, outras não. Mas decisões - informadas, pertinentes, assentes na experiência, na técnica, no talento, no nariz - têm de ser tomadas. 

4

A vida lá fora influencia as decisões e o mercado. O assédio e o movimento #metoo são, com méritos, próprios, temas da atualidade. Esta semana apareceu já um nome, por sinal o do que foi um dos mais respeitados editores portugueses. (Nota: trabalhei com ele, como metade da humanidade, temos uma relação cordata; com a Joana Emídio Marques é o contrário.) Isso dividiu o campo em dois: o dos que, como nos grupos mais fechados e corporativistas, dizem «O meu menino não!» e o dos que (ver a votação na nossa turma, por oito a zero) dizem «a queixa parece legítima». Nota A: nenhum de nós estava lá. Nota B: ser «meu amigo» e «uma pessoa respeitável» tão mau argumento como dizer «a vítima tem sempre razão». Nota C: ficou provado que esta área é mesmo endogâmica. E há um terceiro elemento: o jovem editor de sucesso de uma chancela da Porto, Rui Couceiro, que é citado como tendo dito uma coisa mas depois tendo-a veementemente negado em público. Em que ficamos? 

Não percam as cenas dos próximos capítulos. Entretanto, sugiro que sigam o caso. A poeta, ensaísta e professora já escreveu um artigo em defesa do queixoso. Que aliás tem em sua defesa também o poeta e ex-diplomata e ex-ministro da Cultura Luís Castro Mendes, mais uma série de pessoas daquela geração. Do lado da jornalista e escritora também há jornalistas, repórteres, intelectuais - e até poetas, como Rui Almeida. 

Eu só digo: não me comprometam! Mas dizer «não me comprometam» é um bocadinhochinho contrário à imagem do intelectual destemido que não tem 'medo' de dizer as coisas, certo? 

3. Editar é escolher

(...(


2. Atenção à duração dos direitos de autor

Os direitos de autor tornam-se públicos passado algun tempo - antigamente 50 anos, agora 70. Isso fez com que Fernando Pessoa que, nos anos 80, estava no domínio público, nos 90 passasse a ser explorado exclusivamente pela Assírio & Alvim, quenegociou os direitos com as herdeiras do poeta.

O direito à autoria, esse, não caduca. Significa que eu posso editar os sonetos de Camões, sem pagar direitos aos putativos herdeiros, mas não posso dizer que são meus.  

Exemplo: Sacagens da pop a música clássica. Aqui, sobretudo minutos 14'-17'.   



   

segunda-feira, 3 de maio de 2021

Book Trailer: O Pó de Puns do Doutor Proctor

Ana Filipa Leite

Fiz um book trailer para o livro O Pó de Puns do Doutor Proctor, de Jo Nesbø, que encontrei há umas semanas na casa dos meus pais e cujas ilustrações achei interessantes para este exercício.

Agradeço ao meu irmão por ter dado voz a esta parvoíce. Aqui está o vídeo (e aqui está neste link também, com mais qualidade do que o leitor do Blogger permite):



Guia de sinais de revisão

Mesmo com o semestre já findado, deixo aqui  este guia bastante completo dos sinais usados na revisão de texto. O  site  Revisão para quê t...