segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Capas bonitas, conceitos diferentes e ilustrações que empobrecem os livros

 


Ana Filipa Leite

A minha preferência é livros digitais. É assim que vivemos quando o nosso apartamento inteiro é do tamanho da sala de jantar dos nossos pais e a renda é absurda. Não tenho nem 15 euros para dar por cada história que quero ler nem onde guardar tantos livros. Mas às vezes o marketing ou a arte apanham-me e compro livros físicos mais pelo desejo de ser dona de coisas bonitas do que pela vontade de os ler.

O meu Kindle tem livros feios – sobretudo thrillers de capas escuras cujos designers pouco inspirados (ou a quem não foi dada liberdade criativa) retiraram mulheres a correr pela floresta, silhuetas de homens armados e fachadas de mansões góticas de sites de stock images. Mas a minha única estante está cheia de capas de cores vivas com ilustrações criadas exclusivamente para os livros onde se encontram. Essas são as capas que merecem o meu dinheiro.

Por muito bom que o seu conteúdo seja, não quero um livro feioso a ocupar espaço físico quando pode estar enfiado numa pasta digital.

Tenho cópias físicas dos cinco livros na imagem acima, e todos têm essas tais capas coloridas com ilustrações que fazem mais do que aderir às convenções do seu género: as capas revelam algo sobre essa narrativa em particular. O segundo livro, por exemplo, com o desenho dos dois rapazes de mãos dadas, é evidentemente um romance LGBT+. Mas as cores escolhidas aludem ao facto de a bissexualidade ser dos temas desta história. E esses tons roxos e cor de rosa podem atrair leitores que não estariam interessados em mais um romance M/M entre dois homossexuais.

E a última capa, a de Wilder Girls de Rory Power, mostra uma rapariga cuja aparência física se deteriora e revela flores no seu interior. Sabemos imediatamente que ela é a protagonista e que algo de errado e sobrenatural – mas talvez também bonito, porque tudo o que tem flores é pelo menos um bocadinho bonito – se passa. Sendo este livro um thriller que tem lugar num colégio interno, a capa poderia retratar apenas mais uma mansão cheia de spooky vibes. Mas foi muito mais longe. Eu olho para a capa e quero saber tudo sobre esta rapariga.

Ao juntar estes cinco livros, percebi que tendo a comprar livros com flores na capa. Sou trouxa pelas florzinhas.


Mas não são só as cores, as ilustrações e as flores que me apanham. Capas com conceitos fora do comum também têm de ser minhas. Este livro (no vídeo acima) sobre uma casa assombrada assombra o meu quarto com a sua luzinha de presença irritante. Mas eu tinha de o ter, porque MEU DEUS, ELE BRILHA NO ESCURO. Como tive de ter outros livros porque AI AI, ELES TÊM TEXTURA. 

Até a ausência de capa pode ser uma capa atraente que dá vontade de gastar dinheiro. A empresa Blind Date with a Book vende livros escondidos dentro de embrulhos simples. As capas – e os títulos e autores – são-nos inacessíveis até os comprarmos. Não há garantias de que os livros tenham bom aspeto ou até de que não os tenhamos já lido. Comprá-los é um risco, e a Blind Date with a Book sabe que o que é arriscado é sexy.

Comprei-lhes quatro livros de uma vez.


Um tipo de livro físico com que nunca me vão apanhar, apesar das suas cores vibrantes, é aquele cujas ilustrações parecem desenhos animados, da pior maneira possível.

Os desenhos desta tendência nem têm de ser feitos por ilustradores/designers. Qualquer miúdo de seis anos com a Pen Tool do Photoshop faz igual, copiando os contornos de fotografias. Até o computador sozinho conseguiria o mesmo efeito. O resultado é rasca e infantil, apesar de ser muito utilizado em bons livros para leitores adultos que contêm temas pesados. Estas capas não transmitem, de maneira nenhuma, a essência e diversidade dos livros, porque elas próprias estão isentas de complexidade e parecem todas iguais. É que nem um sombreadozinho têm.

Resumindo, deem-me capas únicas, deem-me capas coloridas e boas ilustrações, mas ai de quem me ponha à frente uma capa genérica. 

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