Francisco Rúbio
Há algumas aulas, falámos da lei do preço fixo. Ideia brilhante de um homem descarrilado. É pena que a lei não seja respeitada em Portugal. Mais que a pena, é a morte. A morte das livrarias independentes. Sabemos que no mundo neoliberal, olha, é o salve-se quem tiver poder. E por isso mesmo, temos todos de apoiar as pequenas livrarias a que costumamos ir.
Temos? Porquê?
As grandes plataformas digitais têm descontos sempre que as visito. O meu bolso diz: “aproveita imediatamente!”; a minha consciência diz o mesmo que Teolinda Gersão: “sem os livreiros e livrarias independentes muitas obras com interesse e valor nunca entrariam nas grandes livrarias, e, se acaso entrassem, ficariam atrás de outras, numa prateleira, sem visibilidade, nunca chegando às bancas, e muito menos à luz de uma vitrine.” Perder uns euros agora ou perdermos opções de escolha para o futuro? É neste jogo de dúvida, vivendo no mundo onde “o dinheirinho é muito importante”, que nos encontramos todos, leitores.
O conto mercantilista do Natal está a duas folhas de distância. Como decido onde comprar?
Tentando servir os vários senhores: os editores, os livreiros e o nosso bolso. Os editores vendem-nos directamente os livros que queremos oferecer. Com desconto e no conforto do sofá. Os livreiros oferecem-nos uma conversa e o livro que estávamos à procura, só ali, e o livro que nem estávamos à procura, e olha está ali.
E se estas livrarias são espaço que alimenta o nosso pensamento, nas cidades as bibliotecas têm também a sua uma missão. Roubo as palavras de Rui Tavares, acerca de uma possível Biblioteca Eduardo Lourenço “não tanto apenas de acervo de livros, mas também (e sobretudo) de lugar de encontro, de disponibilização de espaços de estudo, de estúdios para gravar podcasts ou vídeos, de salas multimédia onde ter acesso a comunicação social de todo o mundo, de espaços de debate e de animação cultural permanente.”
O livro “Ensaio sobre a cegueira”, publicado em 1995, por José Saramago, foi considerado um dos melhores livros de 2020 pela New Yorker. O livro despertou o interesse em Jill Lepore, jornalista da New Yorker, por altura do início da pandemia - neste sentido, “A Peste” de Albert Camus deve ter sido o mais procurado. A importância da tradução: colocar Saramago nas leituras universais, dez anos depois de morto, milhões de anos para seguir vivo.
Um breve exemplo de dúvida (eterna?) na tradução em português de Portugal: “O Porco Triunfante”, em 1946, “O Triunfo dos Porcos”, em 1976, “A Quinta dos Animais”, em 2017.
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