quinta-feira, 22 de outubro de 2020

Comer um livro (pontos 10, 6.3. 0.1)

Inês Carvalhal

10. O que quero ler/editar?/ 6.3. Onde pára o livro?/ 0.1. O que é editar?

Há cerca de uma semana estava a prepara uma tarte de alho-francês assado, Feta e Dijon enquanto pensava no que tinha para dizer sobre edição. Foi quando barrava o creme de Feta na base para tarte previamente picada, que me apercebi de quanta comunhão cozinha — edição/publicação existia na minha vida.

Foi na minha adolescência que comecei um affair descomprometido com as duas: jantares com especiarias novas e fins-de-semana em corte e colagem com fanzines punkitas.   

A primeira revista que tive chamava-se Sheena. Construíamo-la — eu e amigos — nos intervalos da escola com uma linha editorial no limiar da homeostase. Tivemos um número dedicado à banda-desenhada, os outros só com desenhos, colagens e textos vagamente aleatórios.  Mais tarde ingressei em projectos que apesar de mais estruturados continuavam a carregar um relativo descomprometimento.

Sempre cozinhei e felizmente sempre gostei de me cansar na cozinha. Foi no início da minha vida adulta que este hobbie se revelou o meu maior aliado, ajudando-me a pagar renda e férias não pagas.   

Para lá de quaisquer casualidades, existem, a meu ver, questões processuais bastante similares na construção de um livro e na confecção de uma refeição: podemos seguir um plano editorial rigoroso, com calendários quase inflexíveis, como podemos mergulhar no rigor da cozinha sous vide; podemos fazer cozinha de fusão e publicações ambicionas; podemos entrar num projecto editorial super experimental ou criar a refeição mais surpreendente com os restos que temos no frigorifico; é sabido que sal e gordura são os elementos imprescindíveis para um prato de salivar, tal como a dose certa de suspense e de romance é igualmente saborosa.

Qualquer que seja a fórmula escolhida, o que me continua a fascinar nas duas situações é precisamente a variedade e flexibilidade de escolha que temos quando metemos as mãos na massa para dar algo novo à luz do dia, para mim tendo sempre presente a definição — que apesar não a saber, já a sabia — de punk dada na segunda aula: eu não sei mas faço na mesma.

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