sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Sobre as cinco melhores capas

 Hugo Alexandre Martins


Para esta minha primeira escolha usei a coerência como critério.

Estou convicto de que existe uma relação não apenas de correspondência como de simbiose entre a capa do livro e o conteúdo da narrativa.

A forma clínica, desassombrada e, diria até, pungente como a autora, em quase 700 páginas, disseca e explora temáticas que sabemos delicadas – desde a violência psicológica à ineficácia da justiça – é, para ser eufemístico em extremo, de cortar a respiração. Qualquer leitor, por mais impassível que seja, se vê obrigado, ainda que momentaneamente, a suspender a leitura, vir à superfície e, assim, recuperar o fôlego perdido. A sensação de apneia que transparece da capa, onde surge uma mulher  imersa no mar de tormentas que é, enfim, a vida, persegue-nos capítulo após capítulo.

Aproveito o ensejo para manifestar a minha satisfação pelo destaque que é dado ao nome da autora, ainda que Tânia Ganho seja uma figura relativamente desconhecida do grande público.

Integrei nesta minha seleção a capa do livro O eremita viajante pela magia que ressuma dos elementos vários que a compõem. Desde o tradicional quimono japonês às não menos típicas sombrinhas nipónicas, tudo me transporta para o Oriente e para a multitude de costumes e hábitos que fazem do Japão um irrefragável chamariz. Como pano de fundo, a imensa neve que, sobre a ponte e os telhados, num anoitecer invernoso, se vai amontoando, como se nuvens descessem do Céu, como se pedaços de algodão tocassem a Terra.

Ao contemplar a referida capa, senti-me a viajar outros mundos, a explorar diferentes culturas, a conhecer novas gentes.


Resulta notório que as melhores capas são aquelas que falam às tripas da assistência, cativando o leitor, isto é, despertando-o para um produto agradável à vista. À luz desta velha máxima, estou em crer que o designer gráfico do thriller Os Olhos da Escuridão executou um muito bom trabalho.

Há dois aspetos que sobressaem – por um lado, o equipamento de proteção utilizado (célebre em tempos de COVID-19), e, por outro, a referência ao «surto do novo coronavírus». A esta capa, de tão interpelante, ninguém fica imune, ninguém resiste incólume, porquanto alude, explícita ou implicitamente, ao atual contexto pandémico, objeto de vivo interesse. A calamidade que, desde março de 2020, sobre a humanidade paira, tem sido aproveitada por algumas editoras para, numa espécie de jogada comercial de efeito garantido, aumentar o fluxo de vendas.


Impreterível se torna, num exercício como este, dar a conhecer uma das muitas capas da Coleção Dois Mundos, da chancela editorial Livros do Brasil, que nos tem vindo a brindar com maravilhosas edições. De um amplo e diversificado conjunto, optei pela mais recente, a saber: O Templo Dourado, da autoria de Mishima. 

Em meu entender, é uma capa que consegue o altamente improvável – catrapiscar o leitor, mantendo-se sóbria. Dada a riqueza cromática que ostenta, qualquer bibliófilo dela se pode servir para assim adornar as suas estantes.


A capa de Unorthodox – A verdadeira história das minhas raízes foi, das cinco aqui anexadas, a que mais me intrigou. Digo isto por três razões – pelo traço preto que, estrategicamente posicionado sobre o título, compromete a sua legibilidade; pela referência a esse grande império que é a Netflix ; e, motivo principal, pela forma como a jovem surge representada.

Tendo visto a série original, estou em condições de, uma vez mais, me socorrer da coerência como critério de seleção. A capa espelha e traduz, nos termos mais claros possíveis, o fulcro da narrativa. Quando uma simples imagem reflete, na exata medida do pretendido, o conteúdo de quase 300 páginas, dúvidas não restam quanto ao exímio labor desenvolvido pela editora, a quem mérito, no caso vertente, se não pode negar.

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